1º Colóquio sobre HUMANIDADES MÉDICAS/FAMED-UFC/UNIFOR

Sábado, 26 de outubro/2013, das 8h30 às 15h30
Local: Auditório da SOCEP (Sociedade Cearense de Pediatria. Rua Maria Tomásia, 701. Aldeota. Fone: 3261-5849)
O I Colóquio sobre Humanidades Médicas é um evento organizado pelo Grupo HumanAmigos de Humanidades Médicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará em parceria com a Universidade de Fortaleza (UNIFOR).
Participam também da iniciativa: o Núcleo de Ensino, Assistência e Pesquisa da Infância do Departamento de Saúde Materno-Infantil-FAMED/UFC; o Projeto de Vivência da Relação Médico-Paciente (PROVIMP); o Núcleo de Desenvolvimento da Educação Médica (NUDEM); Instituto da Primeira Infância (IPREDE) e o Núcleo de Tecnologias e Educação a Distância em Saúde (NUTEDS).
Localize-se!

Apresentação

HUMANIDADES MÉDICAS: para quê?!
Álvaro J Madeiro Leite


[...] a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar, parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.
Jorge Larossa Bondia
Notas sobre a experiência e o saber da experiência (2004).


Um gesto de interrupção nessa nossa vida cotidiana para que o pensamento volte a ‘a chupar o gosto do dia’!

Parece ser o que muitos insistem em propor como resistência ao desencantamento, à decepção, e às vezes, ao desespero dos tempos correntes.

Edgar Morin, um dos principais pensadores contemporâneos, em seu “Como viver em tempos de crise”, nos adverte: “As crises agravam as incertezas, favorecem os questionamentos; podem estimular a busca de novas soluções e também provocar reações patológicas, como a escolha de um bode expiatório. São, portanto, profundamente ambivalentes”.

A medicina é uma profissão ambivalente. Triunfa e fracassa. Encanta e desencanta. Tem sido uma profissão angustiada pela premência dos nossos tempos; tempos de subjetividades sem referenciais, tempos sociais sem decência e civilidade, tempos de decepção. Tempos de questionamentos da eficácia dos processos pedagógicos, tempos de substituição da relação médico-paciente para uma relação de laços e vínculos frágeis instituição-paciente.

Como fazer frente aos desgastes por qual passa a medicina e seus médicos, compreendendo os nexos existentes entre os aspectos essenciais da sociedade contemporânea e a formação integral dos médicos?

A medicina, talvez seja a profissão que requer mais insistentemente uma dimensão atemporal, a-histórica do homem: quem sente ou vê o chão se esvair por franca ameaça de uma doença sempre desejará encontrar a proximidade do olhar, da escuta, dos bons gestos de um médico. Os desejáveis gestos!!! Um médico de sempre. “Estar nas mãos dos médicos”, muitas vezes representa a esperança do sopro de vida.

Mas hoje muito se fala da impossibilidade temporal e histórica desses gestos! Da existência desse médico.

A proposta desse Colóquio é ajudar a encontrar os cacos que conformem, com o desejo e trabalho de muitos, o mosaico para uma medicina atenta à sua complexa vocação humanista:

O Homem, que constitui o objeto da Medicina, não é o homem abstrato, o indivíduo isolado – que não tem sentido científico – mas o homem concreto, situado socioculturalmente. (...) Se a medicina é sempre medicina do Homem, ela deve, evidentemente, levar sempre na devida conta essa autenticidade humana. Se não faz, deixa de ser medicina, para ser veterinária. 
Gilberto de Macedo. 
Aculturação e doença: introdução à medicina sociocultural (1968).

Produzir-se a si, produzir uma profissão. São dois dos inúmeros desafios que jovens médicos encontram no início de suas carreiras. Carreira, sim, mas seria necessário também levar em conta a seguinte equação: o que a sociedade e as pessoas esperam da medicina e seus médicos/como os médicos compreendem e desempenham o exercício profissional perante a sociedade e as pessoas.

Se as denominadas ciências médicas são fonte indispensável na compreensão dos mecanismos intrínsecos às doenças, precisamos de outras ciências que nos auxiliem na compreensão e respeito do adoecimento humano como experiência individual - a experiência da pessoa doente e sua singularidade.

O campo do conhecimento das chamadas ciências humanas e o das artes pode nos oferecer sabedoria e os insights que possibilitam pensar a condição humana em sua inteireza, sem as fragmentações disciplinares que a transformam em objeto.

É novamente Morin que nos informa:

Cultura das humanidades... é uma cultura genérica, que, pela via da filosofia, do ensaio, do romance, alimenta a inteligência geral, enfrenta as grandes interrogações humanas, estimula a reflexão sobre o saber e favorece a integração pessoal dos conhecimentos.
Edgar Morin
A cabeça bem feita. Bertrand Brasil. 2000.

Nosso Colóquio abre-se à comunidade de médicos e a tantos os generosos colegas de outros campos do conhecimento interessados em encontrar as frestas que nos leve a superar partes do desespero inerente à precária experiência coletiva da existência humana.

Alegro-me em arriscar dizer que nosso Colóquio deseja junto com Drummond sentir que:

...

É noite na roça grande. 

É noite, não é morte, é noite 
de sono espesso e sem praia. 
Não é dor, nem paz, é noite, 
é perfeitamente a noite. 
...

Mas salve, olhar de alegria! 

E salve, dia que surge! 
Os corpos saltam do sono, 
o mundo se recompõe.

Tudo que à noite perdemos 

se nos confia outra vez. 
Obrigado, coisas fiéis! 
Saber que ainda há florestas, 
sinos, palavras; que a terra 
prossegue seu giro, e o tempo 
não murchou; não nos diluímos! 
Chupar o gosto do dia! 
Clara manhã, obrigado, 
o essencial é viver! 

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